Capítulo 13, continuação da postagem anterior.
ACORDEI num leito de hospital, com o braço ligado a um frasco de soro. Foi quando fiquei sabendo que estava hospedado ali devido à ingestão excessiva de bebida alcoólica, traduzindo, tomei um tremendo porre; o aluno de dia chamou a ambulância; isso explica o som de sirene ouvido. Como consequência da embriaguez, caí da cama e rolei para baixo da mesma; aquela escuridão sugeriu um caixão, onde fora posto ainda vivo. Dias antes havia visto na tevê o ocorreu ao ator Sérgio Cardoso, cinco anos antes, que estaria revirado no caixão quando resolveram reabrir o ataúde por suspeita de que teria sido enterrado com vida. Foi um pesadelo simplesmente horrível.
Recebi a visita do Martinelli, que assim demonstrava ser um amigo de todas as horas. O capelão também foi me visitar, aproveitando para dar-me alguns conselhos. Jamais me esqueceria disso.
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Chegava o dia da prova de Matemática |
O plano de usar o sábado e o domingo para estudar Matemática tinha ido por terra. E naquele estado em que encontrava nada eu podia fazer, a não ser torcer para me darem alta a tempo de me integrar à rotina de segunda-feira, e depois aguentar a zoação da turma. E olha que a zoação da turma ainda estaria de bom tamanho comparada ao sentimento de culpa que me atormentava a cabeça pelo fiasco. Grande mico; micaço. Mas o pior ainda estava por vir.
Chegara, finalmente, o dia ‘D’. O friozinho na barriga, comum a qualquer prova, devido ao desconhecido, parecia nessa ocasião mui especial multiplicar-se – para usar uma expressão matemática numa espécie de homenagem irônica à matéria cujo primeiro teste naquela manhã aconteceria. O pesadelo da madrugada de sexta para o sábado apresentava-se a mim, naqueles instantes que antecediam à prova de Matemática, como um inofensivo gatinho frente a um imenso e faminto tigre, que eu não tinha outra saída senão enfrentá-lo.
Ora, convenhamos, o sábado e o domingo anterior, ainda que fossem plenamente aproveitados para a Matemática, mesmo assim resultariam insuficientes para deixar-me minimamente preparado e confiante para aquela batalha fatídica. Agora era tarde; por imprudência ou falta de experiência de vida, deixei tudo para o tal fim de semana, quando o Martinelli iria me dar uma força na Álgebra e na Geometria. Os sábados e domingos anteriores, as cepadas no campo de futebol, no cassino, na capela, na cama antes de dormir, também não me davam segurança para alcançar, pelo menos, a nota mínima. Agora, nenhum tempo mais me restava ao não ser encarar o tigrão.
Confiança! – Animava-me o Martinelli. – Força, Quinze! – Dizia-me o Brito Dias.
Agradecia aos amigos pelo ânimo.
O sargento dava as orientações prévias, como de praxe, dizendo as palavras que já conhecíamos. A prova estava ali, na carteira, de costas para mim. À ordem do fiscal, viraria o teste e só então poderia começar a resolução do mesmo.
Começaria resolver primeiro as questões fáceis, para depois tentar resolver as difíceis. Numa primeira vista, tive a impressão de que o tigre não era assim tão brabo como temia.
Continuei a ler as questões e, infelizmente, a impressão de que não eram difíceis foi apenas impressão. Somente na oitava questão, que era de Geometria, me animei a resolvê-la; a nona, também resolvi. Das trinta questões eu me garantiria com dezoito, mas, correndo daqui e dali, segurança mesmo tinha somente em dez, talvez onze. Era muito pouco. Tinha de resolver mais sete, pelo menos, o que me daria a nota seis. Não, eu não poderia entregar a prova com somente onze questões respondidas.
Voltei às sete primeiras questões deixadas em branco, na esperança de achar resposta para três ou quatro delas. Era possível que sim; consultando o relógio que estava à parede, constatei que ainda faltavam vinte minutos para o término da prova, findo os quais, mais cinco para o preenchimento do formulário de respostas. As questões estavam complicadas e não me animava nem ao menos eliminar duas de quatro, pois com duas que restassem ficaria mais fácil assinalar a verdadeira. Tentei a tática de aplicar as respostas ao problema, invertendo a resolução. Aí teria de contar com a boa sorte, pois se a resposta certa fosse a ‘A’ ou a ‘B’, ganharia tempo. A primeira questão estava fora de alcance, a não ser que desse muita largura no chute, pois nem a fórmula do problema eu lembrava. Decididamente, não era um bom chutador. Fui à segunda, e nessa eu sabia da fórmula, mas me embatuquei no meio da operação com a troca de um sinal, não lembrando se era negativo ou positivo. Então, fui à resolução inversa, explorando a alternativa ‘A’ para ver se dava no problema proposto no enunciado da questão 2. Não era a ‘A’, então bem que poderia ser a ‘B’. Também não era essa. Olhei à parede e o ponteiro grande corria, era o tempo que conspirava contra o aluno despreparado. Aumentava-me a transpiração e o coração me parecia bater mais forte. A resposta ‘C’ daquela questão encaixou bem, mas não lucrei muito porque, por questão de eliminação, em caso de não ser esta a correta, somente restaria a ‘D’; também perdi muito tempo aí. Agora iria à seguinte, que resolvi pular, passando à quarta questão. Nessa tive melhor sorte, pois a ‘A’ encaixava-se plenamente à problemática enunciada. Legal, fui à próxima, que tratava de calcular a área de duas circunferências inscritas numa terceira, ou melhor, tinha de calcular a diferença de área das duas circunferências em relação à terceira, a maior delas, e envolvi muitos cálculos. Muito complicado, pulei, mas aí perdi bastante tempo até chegar à conclusão de que não dava. Que droga! Porque não passei direto à questão seguinte? Faltavam somente dois minutos e o sargento me tomaria a prova; estavam na sala somente eu e mais um outro aluno. Fui então pelas probabilidades, fazendo uma continha rápida; das respondidas com segurança – quinze – seis delas a alternativa certa era ‘C’, depois a ‘A’, que aparecia em quatro questões, a ‘B’ também em quatro questões, e ‘D’ em apenas uma questão. Era grande, pois, a tentação de chutar simplesmente a alternativa ‘D’ na maioria das questões remanescentes, de sorte que, pela lei da lógica, haveria ainda mais umas cinco ou seis letras ‘D’ como resposta nessas questões. O meu raciocínio era simples: se eram quatro alternativas, e o número total de questões era trinta, então logicamente dava uma média de 7 e meio entre elas. Estavam certamente distribuídas de forma que exisitiram naquela prova sete ou oito ‘A’, das quais eu já tinha achado quatro; oito ou sete ‘B’, das quais quatro eu tinha certeza; sete ou oito ‘C’, das quais seis já estavam encontradas; e oito, sete ou seis ‘D’, das quais somente uma eu havia encontrado entre as quinze questões respondidas com segurança. Consequentemente, decidi, sob risco calculado, atribuir a alternativa ‘D’ como resposta de quatro questões. Que fosse o que Deus quisesse.
Preenchi cuidadosamente o formulário de respostas e chamei o sargento.
Continua…
“DEVEMOS aprender a viver juntos como irmãos ou perecer juntos como tolos.” Martin L. King
“AMAI-VOS uns aos outros como eu vos tenho amado.”
(BLOGUE do Valentim em 23set.2011)
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